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Document 52017AB0047

Parecer do Banco Central Europeu, de 8 de novembro de 2017, sobre a revisão do quadro da União em matéria de gestão de crises (CON/2017/47)

OJ C 34, 31.1.2018, p. 17–23 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

31.1.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 34/17


PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU

de 8 de novembro de 2017

sobre a revisão do quadro da União em matéria de gestão de crises

(CON/2017/47)

(2018/C 34/06)

Introdução e base jurídica

Em 2 e 20 de fevereiro de 2017, o Banco Central Europeu (BCE) recebeu do Conselho da União Europeia e do Parlamento Europeu, respetivamente, um pedido de parecer sobre uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 575/2013 no que diz respeito ao rácio de alavancagem, ao rácio de financiamento estável líquido, aos requisitos de fundos próprios e passivos elegíveis, ao risco de crédito de contraparte, ao risco de mercado, às posições em risco sobre contrapartes centrais, às posições em risco sobre organismos de investimento coletivo, aos grandes riscos e aos requisitos de prestação e divulgação de informações, e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (1) (a seguir «alterações propostas do Regulamento Requisitos de Fundos Próprios») (2).

Em 17 e 20 de fevereiro de 2017, o BCE recebeu do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia, respetivamente, um pedido de parecer sobre uma proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2013/36/UE no que se refere às entidades isentas, companhias financeiras, companhias financeiras mistas, à remuneração, às medidas e poderes de supervisão e às medidas de conservação dos fundos próprios (3) (a seguir «alterações propostas da Diretiva Requisitos de Fundos Próprios»).

Em 2 e 20 de fevereiro de 2017, o BCE recebeu do Conselho da União Europeia e do Parlamento Europeu, respetivamente, um pedido de parecer sobre uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 806/2014 no que diz respeito à capacidade de absorção de perdas e de recapitalização das instituições de crédito e das empresas de investimento (4) (a seguir «alterações propostas do Regulamento Mecanismo Único de Resolução»).

Em 20 de fevereiro de 2017, o BCE recebeu do Conselho da União Europeia e do Parlamento Europeu um pedido de parecer sobre uma proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2014/59/UE no respeitante à capacidade de absorção de perdas e de recapitalização das instituições de crédito e empresas de investimento e que altera as Diretivas 98/26/CE, 2002/47/CE, 2012/30/UE, 2011/35/UE, 2005/56/CE, 2004/25/CE e 2007/36/CE (5) (a seguir «alterações propostas da Diretiva Recuperação e Resolução Bancárias») (a seguir, coletivamente, «regulamentos e diretivas de alteração propostos»).

A competência do BCE para emitir parecer resulta do disposto nos artigos 127.o, n.o 4, e 282.o, n.o 5, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, uma vez que tanto os regulamentos como as diretivas de alteração propostos contêm disposições respeitantes às atribuições do BCE no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, conforme o previsto no artigo 127.o, n.o 6, do Tratado, e à contribuição do Sistema Europeu de Bancos Centrais para a boa condução das políticas desenvolvidas pelas autoridades competentes no que se refere à estabilidade do sistema financeiro, conforme o previsto no artigo 127.o, n.o 5, do Tratado. O presente parecer foi aprovado pelo Conselho do BCE nos termos do artigo 17.o-5, primeiro período, do Regulamento Interno do Banco Central Europeu.

1.   Aplicação da norma relativa à capacidade de absorção total das perdas (TLAC) na União

O BCE acolhe com agrado os regulamentos e diretivas de alteração propostos, que visam aplicar a norma relativa à capacidade de absorção total das perdas (Total Loss Absorbing Capacity — TLAC) do Conselho de Estabilidade Financeira (CEF) (6) às instituições de importância sistémica global (G-SII) estabelecidas na União. O alargamento do âmbito dos requisitos da TLAC a um conjunto diferente de instituições de crédito como, por exemplo, outras instituições de importância sistémica (O-SII), suscitaria problemas de calibração, pois estas instituições apresentam perfis muito heterogéneos. Todavia, se se considerar um alargamento do âmbito de aplicação, uma alternativa poderia ser a cobertura de um subconjunto de O-SII semelhantes às G-SII em termos de dimensão, complexidade, modelo de negócio, grau de interligação e importância sistémica, eventualmente com um limite mínimo de calibração mais baixo. Tal permitiria refletir de forma mais precisa as diferenças face às G-SII.

2.   Alterações do requisito mínimo de fundos próprios e passivos elegíveis (MREL)

2.1.

O requisito mínimo de fundos próprios e passivos elegíveis (minimum requirement for eligible liabilities and own funds — MREL) é constituído por dois componentes: um montante de absorção de perdas e um montante de recapitalização. As alterações propostas da Diretiva Recuperação e Resolução Bancárias (7) (DRRB) e do Regulamento Mecanismo Único de Resolução (8) (RMUR) conferem à autoridade de resolução a possibilidade de ajustar o montante de recapitalização do MREL de modo a refletir adequadamente os riscos decorrentes do modelo de negócio, do modelo de financiamento e do risco global (9). A autoridade de resolução poderia assim levar em conta uma provável redução dos ativos e um diferente perfil de risco da instituição subsequente à aplicação de instrumentos de resolução, e ajustar o montante de recapitalização à nova - e mais reduzida - dimensão do balanço.

Além disso, o BCE considera que a autoridade de resolução deveria ser autorizada, depois de consultar a autoridade competente, a aumentar o montante de recapitalização do MREL de forma a prever uma «margem de segurança». Esta pequena reserva garantirá que o grupo e as entidades resultantes da resolução disponham de recursos suficiente para cobrir as perdas e os custos suplementares imprevistos que possam surgir no período posterior à resolução, decorrentes, por exemplo, do resultado final de avaliação ou dos custos ligados à aplicação de um plano de reorganização da atividade. O montante dessa margem de segurança deverá ser fixado de forma casuística, em função do plano de resolução da instituição de crédito.

2.2.

As alterações propostas da DRRB e do RMUR permitem às autoridades de resolução fornecer orientações às entidades no sentido de que estas passem a dispor de fundos próprios e passivos elegíveis que excedam o MREL para cobrir potenciais perdas suplementares da entidade e assegurar, em caso de resolução, a confiança dos mercados (10). O BCE recomenda que a orientação proposta sobre o MREL seja suprimida porque aumenta a complexidade do regime, sem proporcionar vantagens claras. Em primeiro lugar, a orientação sobre o MREL pode aumentar a calibração global do MREL, porque a orientação pode ser percebida pelo mercado como um requisito que deve ser sempre respeitado. O poder de que dispõe a autoridade de resolução para converter a orientação sobre o MREL, em caso de violação sistemática, num MREL rígido (11) pode reforçar a perceção do mercado de que a orientação sobre o MREL contribui essencialmente para o aumento do MREL. Em segundo lugar, a orientação sobre o MREL não é necessária para reforçar a conformidade com o MREL uma vez que o requisito combinado de reserva de fundos próprios já acresce ao MREL na proposta da Comissão. Em terceiro lugar, a orientação sobre o MREL não pode ser justificada pelo objetivo de evitar as restrições automáticas do montante máximo distribuível (MDA) uma vez que a violação do requisito combinado de reserva de fundos próprios que acresce ao MREL não deve, em todo o caso, levar a restrições automáticas imediatas das distribuições (12). Em quarto lugar, a orientação sobre o MREL não parece ser necessária para reforçar a flexibilidade da autoridade de resolução uma vez que o MREL também pode ser ajustado, caso necessário, por exemplo utilizando a margem de segurança proposta.

2.3.

Nos termos das alterações propostas da Diretiva Requisitos de Fundos Próprios (13) (DRFP) (14), as instituições de crédito não cumprem o requisito combinado de reserva de fundos próprios se não dispuserem de fundos próprios e passivos elegíveis suficientes para cumprir, em simultâneo, o requisito combinado de reserva de fundos próprios, os requisitos de fundos próprios, e o MREL. Dado que o requisito combinado de reserva de fundos próprios acresce tanto ao MREL (15) (primeiro cenário), como aos requisitos de fundos próprios (16) (segundo cenário) os poderes para fazer face a um incumprimento das reservas de fundos próprios devem ser moldados à situação subjacente. Se bem que no primeiro cenário a autoridade de resolução esteja em boa posição para exigir um plano de restabelecimento do MREL, no segundo cenário a autoridade competente deverá agir em conformidade com a DRFP.

2.4.

O processo de redução ou eliminação dos impedimentos da resolubilidade em caso de incumprimento das reservas de fundos próprios que acrescem ao MREL (17) deverá ser modificado de forma a incluir a consulta da autoridade competente, tal como já se encontra previsto relativamente a outros impedimentos. Além disso, as autoridades de resolução deveriam igualmente usar de maior flexibilidade em matéria de prazos, a fim de assegurar que a instituição de crédito disponha de tempo suficiente, caso necessário, para desenvolver a estratégia mais adequada à correção do incumprimento das reservas de fundos próprios. Por outro lado, o BCE acolhe favoravelmente a proposta da Comissão que permite à autoridade de resolução exigir que uma instituição altere o perfil de vencimento dos instrumentos do MREL como parte das medidas destinadas a eliminar os impedimentos da resolubilidade (18).

2.5.

O BCE recomenda que as alterações propostas da DRRB e ao RMUR clarifiquem que as autoridades de resolução têm a missão de monitorizar os níveis dos instrumentos elegíveis para o MREL disponíveis, bem como o próprio rácio de MREL, tomando em consideração todos os cálculos das deduções. Deve igualmente clarificar-se que as autoridades de resolução têm ainda a tarefa de monitorizar o cumprimento do MREL e de informar a autoridade competente de quaisquer incumprimentos e outros factos relevantes que possam afetar a capacidade da instituição de crédito para cumprir o MREL ou a orientação sobre o MREL.

2.6.

No caso de um incumprimento do MREL que coincida com o incumprimento dos requisitos de fundos próprios, a autoridade competente deve, em primeiro lugar, reagir ao incumprimento dos requisitos de fundos próprios mediante a adoção das medidas pertinentes, ou seja, medidas de supervisão ou o exercício dos poderes de intervenção precoce, após consulta da autoridade de resolução. Esta consulta deverá ser breve para assegurar uma reação rápida ao incumprimento dos requisitos de fundos próprios. Além disso, ao exercer os seus poderes de reação ao incumprimento do MREL, a autoridade de resolução deve tomar em consideração as medidas adotadas pela autoridade competente.

2.7.

De acordo com as alterações propostas do Regulamento Requisitos de Fundos Próprios (19) (RRFP), o resgate antecipado de passivos elegíveis exige autorização prévia para evitar uma erosão de passivos elegíveis para a recapitalização interna (bail-in). A autoridade de resolução deve ser responsável pela concessão dessa autorização, uma vez que também é responsável pela determinação do MREL e pela definição do montante e da qualidade dos instrumentos que serão necessários ao financiamento da estratégia de resolução preferida (20).

A autoridade de resolução deve ser obrigada a consultar a autoridade competente nos casos em que uma instituição de crédito esteja a converter os passivos elegíveis para efeitos do MREL em instrumentos de fundos próprios para assegurar o cumprimento dos requisitos de fundos próprios, pois a aprovação dessa medida pode ser necessária para preservar a situação de fundos próprios da instituição, na perspetiva da continuação da sua atividade. Finalmente, as alterações devem deixar claro que os instrumentos de passivos elegíveis com um prazo de vencimento residual inferior a um ano também estão sujeitos a este requisito de autorização prévia, sempre que a entidade ou o grupo de resolução se encontrarem em situação de incumprimento do respetivo MREL.

2.8.

O BCE reconhece os méritos das alterações propostas da DRFP que preveem a não aplicação automática das restrições ao montante máximo distribuível, sempre que o incumprimento do requisito combinado de reserva de fundos próprios se deva à incapacidade da instituição para substituir os passivos que deixem de preencher os critérios de elegibilidade ou de prazo de vencimento do MREL (21). Esta isenção deveria ser alargada às situações em que a instituição não cumpra o seu requisito combinado de reservas de fundos próprios que acresce ao MREL (22) devido a uma redução nos seus fundos próprios, mas cumpra o seu requisito combinado de reserva de fundos próprios que acresce aos requisitos de fundos próprios. Em tal situação, a instituição de crédito pode ainda dispor de um nível relativamente elevado de fundos próprios que, considerados isoladamente, independentemente do MREL, seriam suficientes para cumprir os respetivos requisitos de fundos próprios e o respetivo requisito combinado de reserva de fundos próprios.

2.9.

O BCE recomenda que a proposta isenção de aplicação de restrições ao montante máximo distribuível não se limite a um prazo de 6 meses, pois qualquer tipo de aplicação automática de restrições ao montante máximo distribuível poderá agravar ainda mais a tensão no mercado de financiamento se houver necessidade de emitir novos instrumentos de fundos próprios ou de dívida (23). Em vez disso, a isenção deverá vigorar pelo prazo de 12 meses, o que concederia mais tempo à instituição para emitir instrumentos elegíveis para efeitos do MREL. Este aspeto assume particular relevância na medida em que os instrumentos do MREL têm geralmente maturidades mais reduzidas do que os instrumentos de fundos próprios, dando assim origem a maiores riscos de financiamento que podem coincidir com futuras tensões nos mercados de financiamento.

2.10.

Do ponto de vista da estabilidade financeira, as detenções cruzadas de passivos do MREL entre instituições de crédito não são desejáveis. Para evitar a dupla contabilização e limitar os efeitos de contágio, devem aplicar-se regras de dedução a todas as detenções de passivos externos do MREL, i.e., emitidos a entidades fora do grupo de resolução, independentemente do tipo de instituição de crédito, ou seja, sem limitá-las às G-SII. O mesmo método atualmente proposto para as G-SII deveria aplicar-se a todas as instituições de crédito, no sentido de que as deduções se apliquem aos passivos elegíveis de MREL e aos fundos próprios com base num método de dedução correspondente. Em termos gerais, outros aspetos das regras de dedução deveriam estar de acordo com o que foi acordado a nível internacional em relação à TLAC, ou seja, na ficha descritiva TLAC e no Quadro de Basileia III (24), incluindo em relação aos grupos bancários com mais de uma autoridade de resolução e de um grupo de resolução.

2.11.

Do ponto de vista da estabilidade financeira, a possibilidade de resolução poderá ser limitada se os novos instrumentos de dívida sénior «não privilegiados», bem como os instrumentos de dívida subordinada, forem detidos por pequenos investidores. Poderá, por conseguinte, tomar-se em consideração a introdução de requisitos de divulgação claros e facilmente compreensíveis e de outras salvaguardas, a fim de consciencializar os investidores para os riscos associados a esses instrumentos. No mesmo sentido, pode ser aconselhável ponderar a imposição de valores nominais mínimos de, pelo menos, 100 000 EUR por unidade para cada instrumento. Este montante aumentaria o limiar de investimento e também a perceção do investidor, restringindo assim o pequeno investimento direto. É necessário estabelecer um quadro jurídico comum a nível da União sobre estas matérias a fim de evitar a adoção nos diferentes Estados-Membros de abordagens divergentes, que conduziriam a uma fragmentação do mercado para estes instrumentos na União (25).

2.12.

O tratamento dos grupos objeto de resolução ao abrigo da abordagem do «ponto de entrada múltiplo» deveria ser clarificado. Em primeiro lugar, a definição de «grupo de resolução» deveria excluir as filiais de países terceiros que sejam elas próprias pontos de entrada, dado que estas serão tratadas separadamente do resto do grupo em caso de resolução (26). Em segundo lugar, as alterações devem esclarecer que o cumprimento do MREL ao nível da entidade de resolução deve ser alcançado numa base consolidada ao nível do grupo de resolução (27). Em terceiro lugar, as regras propostas em matéria de deduções de passivos elegíveis aplicáveis a grupos de resolução ao abrigo da abordagem de ponto de entrada múltiplo (28) devem refletir integralmente a ficha descritiva TLAC no que respeita aos ajustamentos permitidos e às componentes da fórmula.

3.   Disposições transitórias relativas ao MREL

3.1.

A determinação de um período de transição adequado constitui um fator-chave na aplicação de um MREL específico de cada instituição. O nível de défices do MREL potencialmente elevado que pode ocorrer no início da introdução de novos níveis harmonizados pode colocar desafios significativos a certas instituições de crédito no que diz respeito ao cumprimento atempado destes requisitos no atual contexto macroeconómico. O BCE propõe, por conseguinte, que seja introduzido um período de transição mínimo adequado para todas as instituições de crédito, que não deverá ser inferior ao prazo aplicável às G-SII fixado na ficha descritiva TLAC. Além disso, a autoridade de resolução deve dispor de margem de manobra para determinar, numa base casuística, um prazo final de conformidade mais longo do que o referido prazo mínimo harmonizado. O BCE recomenda a clarificação de que qualquer alargamento para além do período mínimo de transição em relação a uma determinada instituição deverá basear-se numa avaliação das dificuldades de cumprimento do MREL enfrentadas por essa instituição devido ao acesso limitado ao mercado ou à capacidade de mercado limitada, ou a limitações semelhantes do ambiente macroeconómico pertinente.

3.2.

O BCE vê também vantagens na introdução de novos critérios de elegibilidade de instrumentos para o MREL que harmonizam os critérios de elegibilidade do MREL com os critérios de elegibilidade da TLAC (29) e introduzem características adicionais que aumentam a permanência dos instrumentos de passivos elegíveis para o MREL (30). Tais critérios irão contribuir para garantir a capacidade de absorção de perdas do MREL no momento da resolução. Todavia, as características adicionais que vão para além dos critérios de elegibilidade para a TLAC podem conduzir a novos défices, nomeadamente por tornarem inelegíveis os passivos com cláusulas de aceleração, os quais devem ser levados em consideração, caso a caso, aquando da fixação do período de transição final para o cumprimento do MREL. Em alternativa, as alterações propostas do RRFP poderiam ser reformuladas para especificar que os passivos que eram anteriormente elegíveis para o MREL mas não estejam em conformidade com as novas características adicionais ficarão cobertos por uma disposição de salvaguarda de direitos adquiridos (grandfathering), ou seja, continuarão a ser elegíveis no futuro tal como são elegíveis ao abrigo do regime atual. A referida salvaguarda deveria ser gradualmente descontinuada ao longo de um horizonte temporal razoável.

3.3.

No que respeita à exigência de que os passivos decorrentes de instrumentos de dívida com derivados incorporados (embedded) devem ser excluídos dos passivos elegíveis, é necessária uma maior clarificação da definição, o que poderá eventualmente conseguir-se através da elaboração de normas técnicas de regulamentação adequadas (31).

4.   Medidas de intervenção precoce

4.1.

Existe uma sobreposição significativa entre as medidas de supervisão previstas na DRFP (32) e no Regulamento MUS (33), do MUS, e as medidas de intervenção precoce previstas na DRRB, tanto em termos de conteúdo como das condições para a sua aplicação. Esta sobreposição suscita dificuldades importantes à aplicação prática das medidas de intervenção precoce, especialmente tendo em conta a falta de clareza dos pressupostos para a mesma.

4.2.

Além disso, os poderes de intervenção precoce do BCE devem ser exercidos com base nos instrumentos nacionais de transposição da DRRB (34), o que leva a incertezas relativamente às medidas disponíveis, e às condições do seu exercício, em cada um dos Estados-Membros.

4.3.

Consequentemente, o BCE recomenda que sejam suprimidas da DRRB as medidas de intervenção precoce que já estejam previstas na DRFP e no RMUR, e que o RMUR seja alterado no sentido de proporcionar uma base jurídica regulamentar para os poderes de intervenção precoce do BCE, a fim de facilitar a aplicação coerente dos mesmos.

5.   Instrumento de moratória de pré-resolução

5.1.

As alterações da DRRB propostas conferem novos poderes de suspensão das obrigações de pagamento e de entrega tanto às autoridades competentes como às autoridades de resolução. Embora acolha favoravelmente a harmonização de tais poderes ao nível da União, o BCE espera que estes poderes tão abrangentes se exerçam apenas, se forem exercidos, em circunstâncias extremas. Devido à natureza excecional e destrutiva dos contratos, a utilização do instrumento da moratória deve ser decidida em coordenação estreita com todas as autoridades pertinentes. O BCE sugere que se crie um procedimento para a atribuição da responsabilidade por uma moratória à autoridade competente ou à autoridade de resolução, consoante a moratória se declare antes ou depois da determinação da situação de «insolvência ou risco de insolvência». Esse procedimento deverá evitar, regra geral, a imposição de moratórias sucessivas. Só excecionalmente, quando tal for justificado pelas circunstâncias do caso concreto e conforme com o princípio da proporcionalidade, deverá a autoridade de resolução poder impor uma moratória adicional que preencha o hiato que medeia entre a determinação da situação de «insolvência ou risco de insolvência» e a adoção da medida de resolução.

5.2.

Em geral, um instrumento de moratória de pré-resolução deve ser distinto e independente das medidas de intervenção precoce. O objetivo primordial de uma moratória de pré-resolução deveria consistir em prevenir a deterioração grave do balanço de uma instituição de crédito. Em especial, o instrumento de moratória de pré-resolução concederia à autoridade competente tempo suficiente para, caso necessário, finalizar a avaliação da situação de «insolvência ou risco de insolvência», tendo também em consideração o tempo necessário para tomar uma decisão formal desse tipo que exige igualmente a consulta da autoridade de resolução. Além disso, uma moratória dá mais tempo à autoridade de resolução para começar a preparar-se, paralelamente, para as suas atribuições em matéria de resolução. O prazo máximo de uma moratória deverá ser de cinco dias úteis, limitação que também se justifica pelo grave impacto de uma moratória nos direitos dos credores. O BCE alerta para o facto de os longos períodos durante os quais os depositantes estão privados do acesso aos seus depósitos minarem a confiança no sistema bancário, podendo, em última análise, colocar em risco a estabilidade financeira.

5.3.

Uma moratória de pré-resolução eficaz necessita de ter um âmbito de aplicação mais amplo possível a fim de permitir uma reação atempada às saídas de liquidez. A exceção genérica dos depósitos cobertos e dos créditos ao abrigo de sistemas de indemnização dos investidores deve ser substituída por isenções discricionárias limitadas, que podem ser concedidas pela autoridade competente a fim de preservar um certo grau de flexibilidade. Nos termos desta abordagem, a autoridade competente poderia, por exemplo, permitir aos depositantes levantar um montante limitado de depósitos numa base diária compatível com o nível de proteção estabelecido na Diretiva relativa ao sistema de garantia de depósito (DSGD) (35), tendo simultaneamente em conta as potenciais restrições técnicas e de liquidez. No intuito de proteger os direitos dos depositantes, deveriam ser acionadas certas salvaguardas, nomeadamente uma comunicação clara sobre o calendário de restabelecimento do acesso aos depósitos. Finalmente, importa avaliar as possíveis implicações com o disposto na DSGD, dado que o instrumento de moratória de pré-resolução não será útil se for considerado como fator gerador da indisponibilidade dos depósitos ao abrigo da DSGD.

5.4.

O BCE recomenda o alargamento das isenções de moratória atualmente aplicáveis às infraestruturas dos mercados financeiros (IMF), com inclusão das contrapartes centrais, a) às centrais de depósito de títulos (CDT) de países terceiros reconhecidas pela Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados nos termos do regulamento relativo às centrais de depósito de títulos (36), e b) aos sistemas de pagamento de países terceiros sujeitos a um acordo de superintendência de colaboração envolvendo pelo menos um banco central do Sistema Europeu de Bancos Centrais. Uma suspensão que proíba a um participante (instituição de crédito) a efetuação de quaisquer pagamentos a uma IMF terá por consequência, na prática, que esse participante deixará de estar em condições de cumprir as suas obrigações na data de vencimento. No que respeita às obrigações face às IMF, tal colocaria o participante em situação de incumprimento. Sem uma isenção para este tipo de pagamentos, a moratória teria efetivamente o potencial de criar e disseminar o risco sistémico antes que as salvaguardas da IMF produzissem efeitos (37).

5.5.

A harmonização proposta dos poderes de imposição de moratórias de pré-resolução também não deve prejudicar quaisquer outros poderes de imposição de moratórias, nomeadamente os poderes de supervisão ou judiciais, introduzidos a nível nacional para salvaguardar o princípio par condicio creditorum (ou de igualdade de tratamento de credores) aquando da abertura do processo de insolvência. Se uma instituição de crédito não entrar em resolução aquando da imposição de uma moratória, por exemplo, porque a autoridade de resolução determinou que a resolução não seria de interesse público, esses instrumentos nacionais podem voltar a ser relevantes. Uma situação similar pode ocorrer se a entidade em dificuldades entrar em insolvência na sequência da aplicação dos instrumentos de resolução.

5.6.

As exceções previstas na DRRB para os bancos centrais, incluindo as respeitantes ao instrumento de moratória de pré-resolução, devem ser alargadas de modo a abranger o Banco de Pagamentos Internacionais (BIS). O BIS tem por atribuições promover a cooperação entre bancos centrais, proporcionar mecanismos adicionais para operações financeiras internacionais e atuar como fiduciário ou agente em relação às compensações financeiras internacionais. É, por conseguinte, conveniente que receba um tratamento semelhante ao de um banco central nos termos da DRRB.

5.7.

Deveriam realizar-se outras análises respeitantes ao reconhecimento do instrumento de moratória ao abrigo das leis de países terceiros, mais especificamente nos casos em que ainda não foi estabelecido um mecanismo de reconhecimento. Em especial, deveria dar-se especial atenção às potenciais implicações deste instrumento para o Universal Resolution Stay Protocol de 2015 da International Swaps and Derivatives Association, que só reconhece o período mais curto de uma suspensão com a opção de renúncia em relação a ordens jurídicas que posteriormente modifiquem a duração da suspensão legal.

5.8.

Por último, as possíveis implicações dos requisitos regulamentares de supervisão devem ser cuidadosamente analisadas, tendo em conta a duração proposta dos instrumentos de moratória e a suspensão prevista dos direitos de rescisão ou de compensação.

6.   Avaliação da situação de «insolvência ou risco de insolvência» relativamente a instituições de crédito menos significativas sob a responsabilidade direta do Conselho Único de Resolução (CUR)

Se bem que as alterações propostas do RMUR não abordem este tema, o procedimento de resolução estabelecido no RMUR exige atenção urgente. Mais especificamente, a discrepância entre as competências do BCE e do CUR em combinação com a atual redação do RMUR suscita incerteza jurídica quanto à determinação da autoridade responsável pelo juízo sobre se uma instituição de crédito menos significativa, sob a responsabilidade do CUR, está em situação ou em risco de insolvência. Não obstante uma interpretação literal do artigo 18.o do RMUR sugerir que o BCE é responsável por avaliar as situações de «insolvência ou risco de insolvência» no que respeita a certas instituições de crédito menos significativas, tal interpretação não tem em conta as limitações contidas no direito primário da União. De facto, uma interpretação sistemática do quadro jurídico da União sugere que a avaliação da situação de «insolvência ou risco de insolvência», relativamente tanto aos grupos transfronteiriços menos significativos, como a outras instituições de crédito menos significativas sob a responsabilidade direta do CUR, deve ficar fora da competência direta do BCE e constituir, em vez disso, uma competência das autoridades nacionais competentes, na sua qualidade de autoridades de supervisão competentes para as instituições de crédito menos significativas nos termos do Regulamento do MUS (38). O BCE recomenda uma ampliação das alterações propostas do RMUR para prever expressamente que a respetiva autoridade nacional competente é responsável pela avaliação da situação de «insolvência ou risco de insolvência» respeitante a uma instituição de crédito menos significativa sob a alçada do CUR (39).

As sugestões específicas de especialistas do BCE de reformulação dos regulamentos e diretivas de alteração propostos, acompanhadas de um texto explicativo, constam de um documento técnico de trabalho separado que está disponível, em versão inglesa, no sítio Web do BCE. O documento técnico de trabalho não foi adotado pelo Conselho do BCE.

Feito em Frankfurt am Main, em 8 de novembro de 2017.

O Presidente do BCE

Mario DRAGHI


(1)  COM(2016) 850 final.

(2)  O BCE adotou um parecer separado sobre algumas das alterações propostas ao Regulamento Requisitos de Fundos Próprios e à Diretiva Requisitos de Fundos Próprios; ver Parecer CON/2017/46. Todos os pareceres do BCE estão publicados no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

(3)  COM(2016) 854 final.

(4)  COM(2016) 851 final.

(5)  COM(2016) 852 final.

(6)  Ver o documento do CEF intitulado «Principles on Loss-absorbing and Recapitalisation Capacity of G-SIBs in Resolution Total Loss-absorbing Capacity (TLAC)», ficha descritiva de 9 de novembro de 2015 (a seguir «Ficha descritiva TLAC do CEF»), disponível no sítio Web do CEF em www.fsb.org

(7)  Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e resolução de instituições de crédito e empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE, e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 173 de 12.6.2014, p. 190).

(8)  Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um mecanismo único de resolução e de um fundo único de resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO L 225 de 30.7.2014, p. 1).

(9)  Proposto novo artigo 45.o-C, n.o 3, da DRRB e proposto novo artigo 12.o-D, n.o 3, do RMUR.

(10)  Ver o proposto novo artigo 45.o-E, n.o 1, da DRRB e o proposto novo artigo 12.o-F, n.o 1, do RMUR.

(11)  Ver o proposto novo artigo 45.o-E, n.o 3, da DRRB.

(12)  Ver pontos 2.9 e 2.10.

(13)  Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO L 176 de 27.6.2013, p. 338).

(14)  Ver o proposto novo artigo 141.o-A da DRFP.

(15)  Ver o proposto novo artigo 141.o-A, n.o 1, alínea d), da DRFP.

(16)  Ver o proposto novo artigo 141.o-A, n.o 1, alíneas a), b) e c), da DRFP.

(17)  Ver o proposto novo artigo 17.o, n.o 5, alínea h-1), da DRRB.

(18)  Ver o proposto novo artigo 17.o, n.o 5, alínea j-1), da DRRB.

(19)  Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO L 176 de 27.6.2013, p. 1).

(20)  Esta solução está em consonância com a opinião expressa no ponto 2.6.

(21)  Ver o proposto novo artigo 141.o-A, n.o 2, da DRFP.

(22)  Ver o proposto novo artigo 141.o-A, n.o 1, alínea d), da DRFP.

(23)  Note-se que um incumprimento do requisito combinado de reserva de fundos próprios também pode ocorrer com níveis elevados de capital regulamentar, quando uma instituição de crédito cumpre efetivamente uma parte significativa do seu MREL através de fundos próprios, e não de outros passivos elegíveis para efeitos do MREL.

(24)  Disponível no sítio Web do Banco de Pagamentos Internacionais (BPI/BIS), em www.bis.org

(25)  Ver também o ponto 3.5 do Parecer CON/2017/23.

(26)  Essa clarificação sobre o tratamento das filiais em países terceiros pode ter um efeito importante no MREL em relação a estes tipos de grupo.

(27)  Ver o proposto novo artigo 11.o, n.o 3, do RRFP.

(28)  Ver o proposto novo artigo 72.o-E, n.o 4, do RRFP.

(29)  A principal diferença que persiste é o facto de a subordinação não ser exigida para todas as instituições e de os títulos de dívida estruturados serem, em certas condições, elegíveis para o MREL.

(30)  Ver o proposto novo artigo 72.o-B, n.o 2, alínea h), do RRFP, sobre incentivos à recompra, j) sobre opções de reembolso exercidas a critério do emitente, k) sobre a necessidade de cumprimento das condições estabelecidas nos artigos 77.o e 78.o do RRFP, l) sobre a não indicação de reembolso antecipado, m) sobre a não atribuição de direitos de aceleração ao detentor, e n) sobre o nível de pagamentos não estar dependente da qualidade de crédito da instituição.

(31)  Ver também o ponto 2.1.2 do Parecer CON/2017/6.

(32)  Ver, em especial, o artigo 104.o da DRFP.

(33)  Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao Banco Central Europeu atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO L 287 de 29.10.2013, p. 63), em especial o artigo 16.o.

(34)  De harmonia com o artigo 4.o, n.o 3, do RMUS.

(35)  Diretiva 2014/49/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa aos seguros de vida (JO L 173 de 12.6.2014, p. 149). A título de exemplo, o artigo 8.o, n.o 4, desta diretiva prevê que, durante um período de transição os depositantes devem ter acesso, no prazo de cinco dias úteis a contar da apresentação do pedido, a um montante adequado dos seus depósitos cobertos para fazerem face ao custo de vida.

(36)  Ver o artigo 25.o do Regulamento (UE) n.o 909/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014, relativo à melhoria da liquidação de valores mobiliários na União Europeia e às Centrais de Valores Mobiliários (CSDs) e que altera as Diretivas 98/26/CE e 2014/65/UE e o Regulamento (UE) n.o 236/2012 (JO L 257 de 28.8.2014, p. 1).

(37)  Por este motivo, existe um entendimento comum a nível internacional e da União (leis sobre o caráter definitivo da liquidação e os «atributos fundamentais» do CEF) sobre a necessidade de proteger de uma moratória as obrigações financeiras relacionadas com as IMF.

(38)  Ver o artigo 6.o, n.o 4, do RMUS.

(39)  As mesmas considerações aplicam-se, mutatis mutandis, às disposições do artigo 21.o do RMUR.


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