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Document 52017AB0038

Parecer do Banco Central Europeu, de 20 de setembro de 2017, sobre uma proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a um enquadramento para a recuperação e resolução das contrapartes centrais e que altera os Regulamentos (UE) n.° 1095/2010, (UE) n.° 648/2012 e (UE) 2015/2365 (CON/2017/38)

OJ C 372, 1.11.2017, p. 6–16 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

1.11.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 372/6


PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU

de 20 de setembro de 2017

sobre uma proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a um enquadramento para a recuperação e resolução das contrapartes centrais e que altera os Regulamentos (UE) n.o 1095/2010, (UE) n.o 648/2012 e (UE) 2015/2365

(CON/2017/38)

(2017/C 372/05)

Introdução e base jurídica

Em 7 e 24 de fevereiro de 2017, o Banco Central Europeu (BCE) recebeu do Conselho e do Parlamento Europeu, respetivamente, um pedido de parecer sobre uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo a um enquadramento para a recuperação e resolução das contrapartes centrais e que altera os Regulamentos (UE) n.o 1095/2010, (UE) n.o 648/2012 e (UE) 2015/2365 (1) (a seguir «regulamento proposto»).

A competência do BCE para emitir parecer baseia-se no artigo 127.o, n.o 4, e no artigo 282.o, n.o 5, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, uma vez que o regulamento proposto contém disposições relativas às atribuições fundamentais do Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC), de definição e execução da política monetária da União e de promoção do bom funcionamento dos sistemas de pagamentos, nos termos do primeiro e do quarto travessões do artigo 127.o, n.o 2, do Tratado, e à atribuição do SEBC de contribuição para a boa condução das políticas referentes à supervisão prudencial das instituições de crédito e à estabilidade do sistema financeiro, nos termos do artigo 127.o, n.o 5, do Tratado. O presente parecer foi aprovado pelo Conselho do BCE nos termos do artigo 17.o-5, primeiro período, do Regulamento Interno do Banco Central Europeu.

1.   Observações genéricas

1.1.

O BCE apoia veementemente a iniciativa da Comissão de criar um enquadramento da União específico para a recuperação e a resolução das contrapartes centrais (CCP) enquanto componente integrante do quadro legislativo da União para os mercados financeiros, no âmbito do qual as CCP desempenham um papel essencial de gestoras de riscos em muitos segmentos de mercado. A continuidade das suas funções essenciais é fundamental para a estabilidade do sistema financeiro da União e para o mecanismo de transmissão da política monetária. O BCE apoia plenamente o âmbito do regulamento proposto no que respeita a mandatos e poderes das autoridades de resolução, planos de recuperação e de resolução e avaliações da resolubilidade das CCP, medidas de intervenção precoce, fatores de desencadeamento da resolução, instrumentos e poderes de resolução, incluindo os instrumentos públicos de estabilização, e disposições de países terceiros. O BCE também concorda com as linhas gerais do regulamento proposto.

1.2.

Não obstante, o BCE considera que o regulamento proposto pode ser ainda melhorado, sobretudo em quatro aspetos.

1.2.1.

Em primeiro lugar, dado o papel essencial dos participantes compensadores na recuperação e resolução das CCP, estas entidades devem poder fazer uma estimativa fiável e administrar as suas potenciais exposições nos termos do regulamento proposto. Ao mesmo tempo, os eventos de mercado intrinsecamente improváveis que conduzem à recuperação e resolução das CCP não podem ser antecipados na íntegra. As autoridades de resolução necessitam, por conseguinte, de suficiente flexibilidade na conceção das respetivas medidas. O BCE recomenda que o regulamento proposto procure um melhor equilíbrio entre estes dois aspetos: i) dando prioridade, na recuperação, aos instrumentos de repartição das perdas claramente quantificáveis; ii) incentivando as autoridades de resolução a iniciar a resolução quando as medidas para recompensação da sua carteira e para afetação de perdas não cobertas possam causar perdas significativas e imprevisíveis para os participantes compensadores; e iii) proporcionando uma maior transparência ex ante das abordagens e processos de decisão em geral das autoridades de resolução quando estas utilizem o seu poder discricionário em áreas essenciais da resolução. Em princípio, tendo em conta o objetivo geral de preservar a estabilidade financeira na União, as autoridades de resolução devem prestar a devida atenção à necessidade de minimizar o contágio negativo dos participantes nas CCP e do sistema financeiro global.

1.2.2.

Em segundo lugar, um objetivo essencial da resolução das CCP é o de assegurar a continuidade das funções essenciais destas entidades sem incorrer em perdas para os contribuintes. A existência de mecanismos sólidos para assegurar a disponibilidade de fundos do setor privado adequados, para afetar integralmente as perdas financeiras na resolução e repor os recursos financeiros das CCP é, por conseguinte, crucial. Inversamente, qualquer potencial apoio do setor público só deveria ser considerado como uma solução absolutamente de último recurso e como uma medida temporária, para evitar o risco moral e criar incentivos para uma gestão ex ante adequada dos riscos. O BCE considera que as salvaguardas previstas no regulamento proposto deveriam ser reforçadas nos seguintes modos: a) ao realizarem o planeamento da resolução e as avaliações da resolubilidade, as autoridades de resolução deveriam avaliar cuidadosamente a dimensão e credibilidade dos mecanismos de financiamento da resolução das CCP, especialmente no que toca aos cenários que excedem as situações «extremas mas realistas», e adotando uma abordagem baseada em critérios comuns; b) a eventual aplicação de instrumentos públicos de estabilização como uma solução de último recurso deveria ser associada a mecanismos exaustivos e credíveis para a recuperação atempada do financiamento temporário; e c) ao aplicar o princípio de que «nenhum credor deverá ficar em pior situação» para garantir que nenhum participante compensador, nem nenhum acionista ou credor da CCP suportem perdas superiores na resolução do que aquelas em que teriam incorrido num processo de insolvência, deveria partir-se de pressupostos realistas no que diz respeito ao valor da continuidade operacional preservada pela resolução.

1.2.3.

Em terceiro lugar, os mecanismos autónomos da recuperação e resolução das CCP deveriam ser complementados com a cooperação horizontal para garantir a sua coerência e interação eficaz:

As externalidades significativas dos riscos da recuperação e resolução das CCP não ocorrem apenas em relação a cada CCP individual para as partes interessadas diretamente afetadas (conforme reconhecido pelo envolvimento de colégios de autoridades no planeamento da recuperação, no planeamento da resolução e nas avaliações da resolubilidade), mas também em todas as CCP, incluindo as que operam em diferentes ordens jurídicas, como consequência da sua dependência de um conjunto comum de grupos bancários que intervêm como principais membros compensadores e fornecedores de serviços. Além disso, as situações de mercado graves, associadas a um incumprimento pela CCP em cenários de resolução relacionados com o incumprimento dos membros, poderiam afetar várias CCP em simultâneo. Neste contexto, um planeamento credível da recuperação e da resolução que seja adequado à salvaguarda da estabilidade financeira da União poderá não ser alcançável mediante uma abordagem que se centre exclusivamente em cada CCP individual de forma autónoma. Deveria, portanto, ser coordenado entre todas as CCP da União.

É também necessário reconhecer as interdependências estreitas entre a recuperação e a resolução das CCP dado que o planeamento da recuperação constitui parte integrante do planeamento da resolução das CCP. Além disso, o planeamento da recuperação pode ser diretamente afetado pelo planeamento da resolução, através de medidas que se destinam a resolver eventuais obstáculos à resolubilidade. Os planos de recuperação e os acordos contratuais relacionados com esses planos celebrados entre as CCP e os participantes compensadores também desempenham um papel importante na determinação do princípio de que «nenhum credor fica em pior situação» na resolução por referência à situação contrafactual da insolvência. Por último, é impossível delinear na íntegra, de antemão, o limite entre a recuperação e a resolução. Neste contexto, o BCE considera que a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) deve ser incumbida de desenvolver uma perspetiva holística sobre a capacidade do panorama da compensação centralizada da União para resistir a potenciais situações de mercado de natureza sistémica que excedam as condições «extremas mas realistas» e envolvam cenários de recuperação e de resolução. No desempenho dessa tarefa, a ESMA deve colaborar estreitamente com o SEBC, incluindo o BCE quando este exerce as suas atribuições de supervisão prudencial, e a Autoridade Bancária Europeia (EBA), tendo em conta as implicações significativas da recuperação e resolução das CCP para os bancos centrais, nos seus papéis de bancos centrais emissores e de superintendentes, e para as autoridades de supervisão bancária.

1.2.4.

Em quarto lugar, dada a natureza cada vez mais transfronteiriça da compensação centralizada e do elevado nível de concorrência no mercado, a existência de condições de igualdade entre todas as CCP é fundamental. Embora as CCP e as autoridades de resolução devam dispor de flexibilidade e de poder discricionário adequados na conceção de planos individuais de recuperação e de resolução, respetivamente, em conformidade com as suas necessidades e circunstâncias específicas, é necessário que exista coerência nos planos de recuperação e de resolução em termos da exaustividade e do rigor das abordagens incorporadas. Por conseguinte, tais planos devem estar em conformidade com as normas internacionais pertinentes (2). Neste contexto, o BCE sugere o aperfeiçoamento do regulamento proposto mediante um melhor alinhamento do conteúdo dos planos de recuperação e de resolução e das avaliações da resolubilidade das CCP da União com o que foi acordado e/ou está a ser desenvolvido a nível internacional.

1.3.

O regulamento proposto aplica-se a todas as CCP da União, independentemente de estas deterem ou não uma licença bancária. Embora o BCE apoie, em princípio, esta abordagem, considera que seria vantajoso, dadas as especificidades das instituições de crédito, considerar a introdução de mais algumas clarificações no que diz respeito à aplicação do regulamento às CCP com uma licença bancária, por exemplo tendo em conta as questões que se podem levantar em matéria de tratamento dos depósitos de participantes protegidos pela Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (3) na recuperação ou na resolução das CCP.

1.4.

Em 13 de junho de 2017, a Comissão Europeia publicou uma proposta de regulamento que altera o Regulamento (UE) n.o 1095/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho (4) (a seguir «Regulamento ESMA») e o Regulamento (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (5) (a seguir «Regulamento EMIR») no que respeita aos procedimentos e às autoridades envolvidos na autorização e supervisão das CCP estabelecidas na União, incluindo o reforço do papel do banco central emissor em relação a determinados aspetos da supervisão das CCP e a criação de uma Sessão Executiva CCP do Conselho de Supervisores da ESMA (6). O BCE sublinha que este parecer se baseia no quadro legislativo da União existente e não prejudica a posição que o BCE venha a adotar em possíveis futuras medidas de reforço das funções e responsabilidades em matéria de supervisão das CCP do banco central emissor ao nível da União. Neste contexto, o BCE reconhece que poderão ser necessárias alterações específicas para ter em conta o novo papel da Sessão Executiva CCP nos colégios ao abrigo do Regulamento EMIR e, subsequentemente, nos colégios de resolução. De igual modo, apoia plenamente a ideia de que, durante a ultimação do regulamento proposto, a Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu avaliem cuidadosamente o potencial papel da Sessão Executiva CCP na promoção da coerência e interação eficaz dos planos de recuperação e de resolução em todas as CCP, e na monitorização e atenuação das suas implicações de risco agregado para a estabilidade financeira na União, de acordo com as observações do BCE constantes dos pontos 1.2.3 e 1.2.4.

2.   Observações específicas

2.1.   Envolvimento dos bancos centrais na recuperação e na resolução

2.1.1.   Mecanismos para envolvimento dos bancos centrais

O eventual incumprimento por uma CCP implica riscos financeiros significativos que, se não forem geridos de forma atempada e eficaz, podem representar uma grave ameaça para as infraestruturas interdependentes do mercado financeiro e para as instituições financeiras que participam nas CCP ou prestam serviços a estas entidades e, em última análise, para a estabilidade financeira e monetária. Por conseguinte, a existência de mecanismos adequados de recuperação e de resolução das CCP que assegurem que estes riscos sejam evitados de uma forma atempada e eficaz tem relevância direta para as responsabilidades dos bancos centrais em matéria de definição e execução da política monetária, de promoção do bom funcionamento dos sistemas de pagamentos, de contribuição para a estabilidade financeira e, caso aplicável, de supervisão das instituições de crédito. Além disso, bancos centrais devem ter um papel prominente, tanto na conceção como na execução das estratégias de recuperação e de resolução das CCP, na sua qualidade de: a) Superintendentes; b) Fornecedores de serviços essenciais de pagamento e de liquidação às CCP; e c) Eventuais fornecedores às CCP e/ou aos principais membros compensadores de liquidez, a qual é fornecida segundo o critério dos bancos centrais em questão e de acordo com as regras aplicáveis.

O BCE sublinha a necessidade de o ESMA cooperar para efeitos do regulamento proposto, não só com a Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (EIOPA) e com a EBA, mas também com o BCE e com o SEBC no que diz respeito ao desempenho das atribuições do SEBC de definição e execução da política monetária e de promoção do bom funcionamento dos sistemas de pagamentos e das atribuições do BCE relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (7). Neste sentido, os bancos centrais emissores da União e os superintendentes das CCP deveriam ser envolvidos na cooperação horizontal relativa à recuperação e resolução das CCP em todas as CCP da União, conforme explicado no ponto 2.2, e na elaboração de normas técnicas de regulamentação (NTR) relativas aos pormenores técnicos dos planos de resolução, das avaliações da resolubilidade, e do funcionamento de colégios de resolução conforme referido nos pontos 2.2, 2.4 e 2.5.

2.1.2.   Regime de votação nos colégios de resolução

Nos termos do artigo 4.o, nos 1 e 2, do regulamento proposto, a autoridade de resolução deve estabelecer, gerir e presidir a um colégio de resolução que inclui, entre outros membros, os «bancos centrais emissores das moedas da União mais relevantes relativamente aos instrumentos financeiros compensados» (8) e as «autoridades competentes responsáveis pela supervisão dos membros compensadores da CCP estabelecidos nos três Estados-Membros com as maiores contribuições para o fundo de proteção da CCP» (9).

Quando os bancos centrais do Eurosistema, que formam conjuntamente o «banco central emissor» do euro, são representados pelo BCE ou por um banco central nacional (BCN), e a supervisão prudencial de instituições de crédito que são importantes membros compensadores das CCP é exercida pelo BCE, deverão ser atribuídos votos separados a estes dois papéis. Conforme já salientado pelo BCE (10), estas duas funções são distintas e prosseguem objetivos diferentes, conforme resulta da separação operacional das funções de política monetária e de supervisão prudencial do BCE.

2.1.3.   Os bancos centrais enquanto participantes compensadores

O regulamento proposto (11) estabelece regras e procedimentos relativos à recuperação e resolução das CCP autorizadas nos termos do Regulamento (UE) n.o 648/2012. Por inerência, as suas disposições aplicam-se não só às CCP, mas também aos participantes compensadores das CCP, ou seja clientes e membros compensadores (12). No âmbito das suas operações ao abrigo do Tratado e da legislação nacional, os membros do SEBC podem agir tanto na qualidade de membro compensador como na de cliente. Se as autoridades de resolução decidissem, segundo o seu próprio critério, ativar os instrumentos de repartição das posições e das perdas ao abrigo do regulamento proposto, tal implicaria que os bancos centrais, que atuam como membros compensadores ou como clientes das CCP no âmbito das suas operações legais, participariam na partilha dos prejuízos financeiros. Tais prejuízos poderiam abalar a situação do balanço do banco central e comprometer a sua reputação. Além disso, o enquadramento proposto deve ter em conta as especificidades dos bancos centrais enquanto participantes compensadores das CCP, sem esquecer que a principal causa de incumprimento das CCP é o incumprimento por um ou mais dos seus membros compensadores. Os bancos centrais diferem de outros participantes compensadores das CCP, porque são, por definição, solventes e não estão sujeitos a incumprimentos, devido ao seu estatuto especial que está relacionado com a natureza de direito público do seu mandato. Atendendo aos riscos limitados dos bancos centrais enquanto participantes compensadores das CCP, determinadas CCP permitem que os bancos centrais sejam admitidos como membros compensadores em condições alteradas. É, portanto, difícil aceitar que participantes compensadores das CCP como os bancos centrais, que não apresentam riscos para as CCP em que participam, devam suportar os custos associados ao incumprimento dessas CCP, inclusive num cenário de resolução. Por último, do ponto de vista da coerência com os objetivos do regulamento proposto, é importante evitar a criação de questões ou de mal-entendidos em matéria de risco moral no que diz respeito ao papel dos bancos centrais. O aumento das exposições dos membros do SEBC a uma CCP em situação de incumprimento seria contrário à lógica subjacente ao regulamento proposto, que consiste em evitar o recurso a dinheiros públicos para impedir o incumprimento de uma CCP. Consequentemente, o BCE propõe que quando intervenham como participantes compensadores das CCP os membros do SEBC sejam isentos dos instrumentos de repartição das posições e das perdas previstos nos artigos 28.o a 31.o do regulamento proposto.

2.1.4.   Os bancos centrais enquanto autoridades de resolução

O regulamento proposto prevê que os BCN podem ser designados como autoridades de resolução das CCP (13). Ao mesmo tempo, os BCN têm o papel legal de promover o bom funcionamento dos sistemas de pagamentos e de contribuir para a boa condução das políticas referentes à estabilidade do sistema financeiro, para além de proporcionarem conhecimentos especializados importantes sobre as infraestruturas do mercado financeiro. Não obstante esta função legalmente consagrada, sempre que, ao abrigo do regulamento proposto, um Estado-Membro designe um BCN como autoridade de resolução das CCP, o conteúdo específico da proposta de concessão dessa atribuição ao BCN deve ser avaliado pelo BCE à luz da proibição de financiamento monetário do artigo 123.o do Tratado (14).

Além disso, embora, de acordo com o regulamento proposto, um BCN possa (na sua qualidade de autoridade de resolução) deter total ou parcialmente uma CCP de transição (15), o BCN não pode contrair ou financiar quaisquer obrigações da CCP de transição. O papel do BCN enquanto proprietário de uma entidade dessa natureza deve ser compatível, em todas as circunstâncias, com a proibição de financiamento monetário estabelecida no artigo 123.o do Tratado, e deve ser exercido sem prejuízo da sua independência financeira e institucional (16). Na mesma ótica, o BCE salienta que, em conformidade com o artigo 123.o do Tratado, que proíbe, designadamente, qualquer financiamento das obrigações do setor público face a terceiros, os BCN não podem financiar nenhum dos mecanismos de financiamento suplementares (17) considerados necessários para assegurar a aplicação eficaz dos instrumentos de resolução (18). Tal não prejudica a competência dos bancos centrais para decidirem de forma independente e por sua própria iniciativa, separadamente do seu eventual papel de autoridades de resolução, sobre a disponibilização de liquidez pelos bancos centrais às entidades solventes, de acordo com as normas aplicáveis e tendo em conta os limites da proibição de financiamento monetário estabelecida no Tratado.

2.2.   Colégios ao abrigo do EMIR, colégios de resolução e o Comité de Resolução da ESMA

O BCE apoia o quadro geral de funcionamento dos colégios ao abrigo do EMIR e dos colégios de resolução para efeitos de cooperação em matéria de planeamento da recuperação, planeamento da resolução, avaliações da resolubilidade e resolução. Contudo, dada a necessidade do envolvimento efetivo dos bancos centrais e das autoridades de supervisão bancária tanto na conceção como na execução das estratégias de recuperação e de resolução das CCP, o BCE recomenda que as NTR que descrevem o funcionamento dos colégios de resolução sejam elaboradas em cooperação estreita com o SEBC, incluindo o BCE no exercício das suas atribuições de supervisão prudencial, e a EBA.

Além disso, conforme referido no ponto 1.2.3, os mecanismos relativos aos colégios ao nível de cada CCP individual deveriam ser complementados com uma estrutura horizontal que tenha em conta os mecanismos de recuperação e resolução em todas as CCP de toda a União. Para promover abordagens coerentes e a interação eficaz dos mecanismos de recuperação e resolução em todas as CCP da União, a ESMA deve avaliar os mecanismos de recuperação e resolução das CCP em termos do seu efeito agregado para a estabilidade financeira da União por meio da realização frequente de testes de esforço e de exercícios de simulação de crise relativos a potenciais situações de pressão sistémicas. Justifica-se uma avaliação combinada do impacto dos mecanismos de recuperação e resolução das CCP tendo em conta as especificidades do processo de recuperação e de resolução das CCP. Ao contrário dos mecanismos criados para os bancos, a resolução das CCP depende o mais possível do processo de recuperação. Nos termos do regulamento proposto, as autoridades de resolução devem, salvo determinadas derrogações, executar as obrigações contratuais existentes e vigentes da CCP antes de aplicar quaisquer instrumentos de resolução (19). Além disso, os seus membros compensadores terão direito a uma indemnização, sempre que uma divergência no previsto nas regras de funcionamento da CCP na resolução os tenha deixado em pior situação do que aquela em que ficariam em caso de liquidação (20).

Ao contrário dos bancos, as CCP não assumem elas próprias o risco financeiro, mas gerem esse risco em nome dos seus membros compensadores. Contudo, os instrumentos de repartição das posições e das perdas dependem essencialmente dos membros compensadores de uma CCP. Neste contexto, as autoridades de supervisão e as autoridades de resolução para as CCP e as autoridades de supervisão bancária devem colaborar estreitamente no planeamento da recuperação e da resolução para assegurar que os bancos possam preparar e gerir de forma adequada as obrigações relacionadas, deste modo reduzindo também o risco de que a recuperação e a resolução das CCP possam dar origem a efeitos de contágio negativos no sistema financeiro em geral. De igual modo, há necessidade de uma coordenação estreita com os bancos centrais nos seus papeis de bancos centrais emissores e de superintendentes, conforme referido no ponto 2.1.1. Por conseguinte, ao exercer as suas atribuições horizontais relativas ao planeamento da recuperação e da resolução, a ESMA deve cooperar com o SEBC e com as autoridades de supervisão bancária, incluindo o BCE no exercício das suas atribuições de supervisão prudencial. Nessa conformidade, o regulamento proposto deveria incluir, de uma forma mais geral, a exigência de que a ESMA coopere com o SEBC.

Por último, pode ser necessário reconsiderar a posição do BCE no que diz respeito à autoridade que deve ser incumbida da avaliação horizontal dos mecanismos de recuperação e de resolução das CCP após a conclusão da revisão em curso da legislação da União em matéria de supervisão das CCP iniciada com a proposta da Comissão de 13 de junho de 2017.

2.3.   Planeamento da recuperação

2.3.1.   Conteúdo dos planos de recuperação

O conteúdo dos planos de recuperação ao abrigo do regulamento proposto exige uma especificação mais pormenorizada. Em especial, o objetivo fundamental do planeamento da recuperação deve ser expressamente indicado no sentido de assegurar a disponibilidade de um conjunto de instrumentos de recuperação que seja exaustivo e eficaz ao permitir que as CCP repartam perdas não cobertas, cubram défices de liquidez, resolvam situações de desequilíbrio e reponham recursos financeiros, incluindo os fundos próprios da CCP, de modo a poderem continuar a prestar serviços essenciais.

De um modo perfeitamente coerente com as disposições do regulamento proposto sobre o conteúdo dos planos de resolução (21), deveria exigir-se às CCP, no mínimo, que distingam, também nos seus planos de recuperação, entre os potenciais cenários de pressão resultantes do incumprimento de um membro compensador e os que são devidos a outros motivos, e que tomem em consideração a combinação destes cenários de recuperação e potenciais situações de natureza sistémica. No que diz respeito às perdas relacionadas com incumprimentos, será importante assegurar que os cenários refletidos sejam suficientemente graves. Deve-se, portanto, exigir às CCP que tomem em consideração o potencial incumprimento de mais de dois dos seus maiores membros compensadores. No que diz respeito às perdas por motivos diferentes do incumprimento pelos membros, deve-se exigir expressamente às CCP, em conformidade com o relatório em matéria de recuperação de 2017 adotado pelo Comité de Pagamentos e Infraestruturas de Mercado (CPMI) e pela Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO) (22), que tenham em conta as perdas de investimento, as perdas comerciais de caráter geral e, caso aplicável, os riscos associados ao não desempenho por parte de terceiros de uma função essencial para a CCP.

Além disso, em coerência com os requisitos previstos no regulamento proposto para os planos de resolução (23), deve indicar-se expressamente que os planos de recuperação devem pressupor não só a ausência de apoio financeiro público extraordinário, mas também a ausência de assistência sob a forma de liquidez de emergência por parte de um banco central, ou de assistência sob a forma de liquidez por parte de um banco central em condições não convencionais em termos de constituição de garantias, de prazos e de taxa de juro.

Os requisitos relativos aos planos de recuperação de que este deve ter em conta os interesses de todas as partes interessadas que possam ser afetadas e assegurar que os membros compensadores não tenham exposições ilimitadas perante a CCP deveriam ser removidos do anexo e inseridos no corpo do regulamento proposto, dada a natureza essencial destes requisitos.

Finalmente, deve especificar-se a sequência dos instrumentos de repartição de perdas dos planos de recuperação. Uma vez que é fundamental que os participantes compensadores se encontrem em condições de medir, gerir e controlar o mais possível as suas potenciais exposições à recuperação, deve ser dada prioridade aos instrumentos que podem ser integralmente quantificados ex ante (tais como os reforços de capital sujeitos a um limite máximo) em detrimento de outros instrumentos de repartição de perdas em que os eventuais montantes em causa dependem em grande parte dos movimentos do mercado e das posições detidas no momento futuro incerto em que se inicie a recuperação.

2.3.2.   Avaliação dos planos de recuperação

O BCE congratula-se com o papel da autoridade de resolução na análise do plano de recuperação a fim de identificar as medidas suscetíveis de afetar negativamente a resolubilidade da CCP e na apresentação de recomendações à autoridade competente sobre estas questões (24). Esta é uma salvaguarda essencial tendo em conta que os planos de recuperação da CCP constituem o ponto de partida da resolução da CCP. Para garantir a eficácia desta disposição, o BCE recomenda a clarificação de que o exame efetuado pela autoridade de resolução pode ter lugar não só no contexto da aprovação inicial de um plano de recuperação, mas também numa fase posterior, quando a autoridade de resolução efetua ou atualiza a sua avaliação da resolubilidade da CCP. A clarificação é importante porque é provável que as autoridades de resolução só realizem o seu planeamento da resolução e as suas avaliações da resolubilidade depois de finalizado o plano de recuperação da CCP.

2.3.3.   Procedimento de coordenação dos planos de recuperação

O BCE considera que o procedimento de votação relativo aos planos de recuperação, a utilizar pelos colégios estabelecidos por força do Regulamento (UE) n.o 648/2012 (25), deve ser alinhado com o procedimento relativo aos pareceres dos colégios previsto no artigo 17.o, n.o 4, e no artigo 19.o do referido regulamento. Para se incentivar o colégio a decidir de forma atempada e reduzir a necessidade de mediação da ESMA para a obtenção de um parecer, será provavelmente mais eficaz especificar que será necessário o voto de uma maioria de dois terços do colégio para desencadear a mediação da ESMA se não se puder alcançar uma decisão por unanimidade no prazo previamente estabelecido (26). Além disso, esta abordagem reforçaria o envolvimento de todas as autoridades competentes pertinentes que poderiam ser afetadas pela decisão do colégio.

2.4.   Planeamento da resolução

2.4.1.   Conteúdo dos planos de resolução

Em conformidade com as suas sugestões relativas ao conteúdo dos planos de recuperação constantes do ponto 2.3.1, o BCE considera que os planos de resolução devem diferenciar melhor os cenários de incumprimento não relacionados com o incumprimento de um membro compensador (27). De igual modo, para garantir que os planos de resolução são adequados para todos os cenários pertinentes que excedam condições «extremas mas realistas», o plano de resolução deveria, no que respeita aos cenários de situações de incumprimento relacionadas com o incumprimento pelos membros, ter em conta não só o incumprimento por um ou mais membros compensadores da CCP (28), mas também o incumprimento de pelo menos três membros compensadores em relação aos quais a CCP tenha as maiores exposições, tendo em conta que às CCP já é exigido, por força do Regulamento (UE) n.o 648/2012, que detenham suficientes recursos financeiros para suportar uma situação de incumprimento de pelo menos dois membros compensadores em relação aos quais a CCP tenha as maiores exposições.

O BCE acolhe com agrado o requisito relativo ao plano de resolução de que este não deve pressupor apoio financeiro público extraordinário, assistência sob a forma de liquidez de emergência por parte de um banco central, ou assistência sob a forma de liquidez por parte de um banco central em condições não convencionais em termos de constituição de garantias, de prazos e de taxa de juro (29). Ao mesmo tempo, dada a importância da prevenção de potenciais perdas para os contribuintes na resolução, o BCE recomenda que o regulamento proposto também exija expressamente que a autoridade de resolução se baseie em suposições prudentes sobre os recursos financeiros necessários para atingir os objetivos da resolução e sobre os recursos que esta espera estarem disponíveis ao abrigo das regras e mecanismos da CCP na data de início da resolução.

Para garantir uma melhor coerência entre os aspetos essenciais do plano de resolução (30) e as normas internacionais, o BCE recomenda que sejam adicionados os seguintes aspetos ao conteúdo mínimo dos planos de resolução.

Uma estimativa do calendário para a reconstituição dos recursos financeiros da CCP (ou seja, do fundo de proteção e dos fundos próprios regulamentares).

Uma descrição da abordagem geral e dos processos de decisão seguidos pela autoridade de resolução em domínios essenciais da resolução com o objetivo de promover o planeamento e a transparência relativamente às partes interessadas no que respeita a futuras ações de resolução (31). Esta deve incluir: a) a futura abordagem de desencadeamento da resolução da autoridade de resolução, incluindo os principais indicadores suscetíveis de influenciar a decisão da autoridade de resolução se sujeitar ou não a CCP a resolução em diferentes tipos de cenários de resolução relacionados ou não com incumprimento dos membros; e b) na medida em que a autoridade de resolução se veja obrigada a afastar-se das regras e mecanismos da CCP, a abordagem geral que se espera que a autoridade de resolução siga no cálculo e repartição das perdas, incluindo a escolha e sequência presumida dos diferentes instrumentos de repartição das perdas, e o modo como se espera que a autoridade de resolução aplique a salvaguarda de que «nenhum credor deverá ficar em pior situação do que aquela em que ficaria num processo de insolvência» e avalie, para os referidos efeitos, as perdas por referência à situação contrafactual.

Uma descrição dos mecanismos de partilha de informação no âmbito do colégio de resolução durante a resolução (32).

O BCE congratula-se com o facto de o regulamento proposto prever o desenvolvimento de NTR para os pormenores técnicos dos planos de resolução (33). No entanto, o BCE salienta que estas NTR deveriam ser elaboradas em cooperação estreita com o SEBC, incluindo o BCE no exercício das suas atribuições de supervisão prudencial, e a EBA. O envolvimento do SEBC é especialmente importante, tendo em conta o papel fundamental que os bancos centrais emissores desempenham na facilitação do acesso continuado a serviços essenciais de pagamento e de liquidação e no fornecimento de liquidez de acordo com os respetivos mandatos.

2.4.2.   Procedimento de coordenação para os planos de resolução

Em conformidade com as sugestões do BCE para o procedimento de coordenação dos planos de recuperação constantes do ponto 2.3.3, o BCE considera que o procedimento de votação a utilizar pelo colégio de resolução relativamente aos planos de resolução (34) deve ser alinhado com o procedimento previsto no artigo 17.o, n.o 4, e no artigo 19.o do Regulamento (UE) n.o 648/2012.

2.5.   Resolubilidade

2.5.1.   Conteúdo das avaliações da resolubilidade

O BCE considera que os aspetos técnicos a considerar pela autoridade de resolução na avaliação da resolubilidade de uma CCP deveriam constar de NTR e não de um anexo ao regulamento proposto (35). Estas NTR deveriam ser elaboradas em cooperação estreita com o SEBC, incluindo o BCE no exercício das suas atribuições de supervisão prudencial, e a EBA.

O BCE congratula-se com o poder atribuído à autoridade de resolução de exigir que a CCP constitua reservas de recursos para aumentar a capacidade de absorção de perdas, de recapitalização e de reconstituição dos recursos pré-financiados, se o financiamento disponível da resolução for considerado insuficiente (36). Para tornar efetivo este poder, as NTR sobre a avaliação da resolubilidade deveriam especificar os critérios mínimos que as autoridades de resolução devem ter em conta ao avaliar a adequação do financiamento da resolução de uma CCP. Este aspeto não é atualmente regulado pelo regulamento proposto (37). No mínimo, a autoridade de resolução deveria ter em conta os seguintes elementos (38):

no caso de cenários de resolução relacionados com incumprimento: a) as características do risco, complexidade e incertezas sobre os preços dos produtos compensados, e a eventual margem de erro relacionada nos cálculos da margem inicial e de variação; b) a dimensão, estrutura e liquidez do mercado subjacente em condições de pressão; c) o número de incumprimentos de membros compensadores que estariam cobertos por recursos pré-financiados e afetados em condições «extremas mas realistas»; d) a disponibilidade e potencial impacto sobre participantes compensadores afetados de instrumentos como a rescisão parcial e a redução de ganhos de margem de variação; e e) a credibilidade de mecanismos não financiados para satisfazerem as eventuais necessidades das CCP; e

adicionalmente, e para todos os tipos de perdas, a substituibilidade da CCP nos mercados onde opera, e a credibilidade de quaisquer mecanismos adicionais, tais como contratos de seguro ou garantias parentais, que possam estar disponíveis para fazer face a perdas de crédito não cobertas.

Além disso, como poderá ser difícil conciliar a obrigação imposta a uma CCP pela autoridade de resolução, nos termos do artigo 17.o, n.o 7, alínea l), de emitir passivos suscetíveis de recapitalização interna (bail-in-able) enquanto instrumento de absorção de perdas com o papel e modelo de negócio das CCP enquanto gestoras do risco, deverá realizar-se uma avaliação exaustiva do impacto antes de se utilizar esta faculdade.

Por último, na elaboração das NTR sobre a avaliação da resolubilidade, a ESMA deve ter em conta as futuras avaliações ou os futuros relatórios elaborados pelo Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board, FSB) sobre recursos financeiros para a resolução das CCP (39).

2.5.2.   Procedimento de coordenação para as avaliações da resolubilidade

Em conformidade com as sugestões do BCE para o procedimento de coordenação dos planos de recuperação e de resolução constantes dos pontos 2.3.3 e 2.4.2, o BCE considera que o procedimento de votação a utilizar pelo colégio de resolução relativamente à avaliação da resolubilidade (40) deve ser alinhado com o procedimento previsto no artigo 17.o, n.o 4, e no artigo 19.o do Regulamento (UE) n.o 648/2012.

2.6.   Resolução

2.6.1.   Objetivos da resolução

O BCE considera que o objetivo da resolução relativo à proteção das finanças públicas limitando ao mínimo o recurso ao apoio financeiro público extraordinário (41) deve ser alargado de modo a incluir uma referência expressa à limitação do risco de potenciais perdas para os contribuintes, uma vez que os mecanismos temporários de financiamento público podem ser concebidos de diferentes formas em termos de salvaguardas para reduzir esses riscos.

2.6.2.   Condições para a resolução

Uma vez que o limite entre a recuperação e a resolução é muito difícil de determinar ex ante e que o desencadeamento oportuno da resolução é essencial para garantir a sua eficácia e evitar a destruição desnecessária de valor económico, é fundamental que as autoridades competentes e as autoridades de resolução cooperem estreitamente no período que antecede a resolução. Por conseguinte, o BCE considera que a autoridade competente deve facultar à autoridade de resolução, sem demora e por sua própria iniciativa, quaisquer informações que possam sugerir que a CCP está em situação ou em risco de incumprimento, e não agir apenas em resposta a pedidos de informação da autoridade de resolução (42).

Além disso, dado o objetivo de manter a estabilidade sistémica, uma das prioridades da recuperação e resolução de CCP é a de evitar perdas imprevisíveis e significativas para os seus membros compensadores. A recuperação e resolução de CCP não será eficaz se se basear fundamentalmente na expetativa de que os membros compensadores podem assumir obrigações de pagamento significativas. O possível incumprimento de outros membros compensadores devido a exposições imprevistas que não possam gerir também poderia exacerbar as tensões existentes no sistema financeiro, especialmente tendo em conta a interligação das CCP. Por conseguinte, os instrumentos de repartição de perdas associados a perdas significativas imprevisíveis para os membros compensadores devem, de preferência, ser utilizados pela autoridade de resolução e não pela própria CCP durante a recuperação. A autoridade de resolução está provavelmente em melhores condições para avaliar as consequências para a estabilidade financeira de uma determinada medida. Neste contexto, o BCE recomenda que o regulamento proposto clarifique que a autoridade de resolução pode tomar medidas de resolução nos casos em que a CCP: a) não possa ou seja improvável que possa recompensar a sua carteira e afetar perdas não cobertas; ou b) só possa recompensar a sua carteira e afetar perdas não cobertas mediante medidas de recuperação suscetíveis de causar perdas imprevisíveis e importantes aos seus membros compensadores.

2.6.3.   Instrumentos de resolução

A fim de evitar o risco moral e minimizar as potenciais perdas para os contribuintes, a aplicação de instrumentos públicos de estabilização (43) deveria não só estar sujeita à condição de aprovação ao abrigo do enquadramento da União para os auxílios estatais (44), mas também depender de mecanismos credíveis para a recuperação atempada e exaustiva dos eventuais recursos disponibilizados.

No que diz respeito aos instrumentos de repartição das posições, o BCE considera que a rescisão parcial deve, em princípio, ser privilegiada em relação à rescisão total, tendo em conta o objetivo importante da resolução de preservar a continuidade das funções essenciais de uma CCP. Recomenda, por conseguinte, que a rescisão integral só seja aplicada nas situações em que a autoridade de resolução considere que nenhuma outra solução oferece melhores resultados para a estabilidade financeira.

2.6.4.   Financiamento da resolução

Tendo em conta o importante objetivo do regulamento proposto de evitar perdas para os contribuintes na resolução das CCP, o BCE considera que as disposições sobre instrumentos públicos de estabilização não indicam de forma suficientemente clara as necessárias salvaguardas. No mínimo, e conforme previsto na orientação internacional do FSB (45), o regulamento proposto deve, como solução de último recurso, incluir nas condições para a aplicação de instrumentos públicos de estabilização a exigência de que as autoridades de resolução: a) Definam um calendário claro para a recuperação dos recursos eventualmente disponibilizados; e b) Assegurem a existência de mecanismos eficazes e credíveis de recuperação destes recursos. Neste contexto, o BCE também considera que a recuperação de despesas incorridas no âmbito da aplicação dos instrumentos públicos de estabilização (46) deve ser ampliada. O BCE apoia a proposta atual de que as despesas devem ser recuperadas, em primeiro lugar, da CCP objeto de resolução, do seu adquirente ou das receitas geradas pelo encerramento das atividades da entidade de transição. Contudo, estas fontes podem não ser suficientes para cobrir todas as despesas incorridas. Por conseguinte, deve-se também exigir às autoridades de resolução que procurem obter a recuperação ex-post de fundos públicos dos membros compensadores de acordo com as regras e mecanismos da CCP, atenuando simultaneamente os riscos para a estabilidade financeira.

2.7.   Princípio de que «nenhum credor deverá ficar em pior situação do que aquela em que ficaria num processo de insolvência»

O princípio de que «nenhum credor deverá ficar em pior situação do que aquela em que ficaria num processo de insolvência» («no-creditor-worse-off-than-in-insolvency», NCWO) constitui uma salvaguarda essencial para garantir que os participantes, acionistas e outros credores das CCP não sejam tratados de modo menos favorável na resolução do que no cenário hipotético alternativo em que a autoridade de resolução não interviesse e a CCP fosse liquidada ao abrigo da legislação em matéria de insolvência aplicável. Ao mesmo tempo, é importante que a metodologia de avaliação subjacente à aplicação deste princípio reflita adequadamente o justo valor da continuidade operacional preservada pela resolução da CCP para evitar a apresentação pelas partes em causa de pedidos de indemnização excessivos. A necessidade de uma abordagem justa e equilibrada a este respeito é sublinhada pelos riscos associados para o setor público, sendo o encargo financeiro suportado, em última análise, pelos contribuintes. A tomada em devida consideração do justo valor da continuidade operacional preservada pela resolução da CCP constitui uma consideração fundamental no contexto da resolução das CCP, que só se deveria prever ter lugar em situações de mercado excecionalmente graves, em que a interrupção das funções essenciais de uma CCP seria muito provavelmente associada a uma destruição em grande escala do valor financeiro e a oportunidades muito limitadas de alternativas de compensação bilateral.

Neste contexto, o BCE considera que a avaliação justa da CCP para efeitos da aplicação do princípio de que «nenhum credor deverá ficar em pior situação do que aquela em que ficaria ao abrigo de um processo normal de insolvência» deveria ser realizada não só em relação a os ativos e passivos constantes do balanço da CCP no momento em que a resolução é desencadeada, mas deveria também basear-se numa avaliação mais abrangente e realista do valor da CCP no caso da sua liquidação, tendo em devida conta as perdas, custos de substituição e a destruição de valor que resultaria do encerramento da atividade ou da liquidação da CCP.

2.8.   Observações técnicas e propostas de redação

Nos casos em que o BCE recomenda alterações ao regulamento proposto, as sugestões de reformulação específicas constam de um documento técnico de trabalho separado, acompanhadas de um texto explicativo para o efeito. O documento técnico de trabalho está disponível em inglês, no sítio web do BCE.

Feito em Frankfurt am Main, em 20 de setembro de 2017.

O Presidente do BCE

Mario DRAGHI


(1)  COM(2016) 856 final.

(2)  Para mais informação sobre as normas internacionais em matéria de recuperação de infraestruturas do mercado financeiro, ver o relatório do Comité de Pagamentos e Infraestruturas de Mercado (Committee on Payments and Market Infrastructures, CPMI) do Banco de Pagamentos Internacionais (Bank for International Settlements, BIS) e da Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (Board of the International Organization of Securities Commissions, IOSCO), «Recovery of financial market infrastructures — Revised Report» [recuperação de infraestruturas do mercado financeiro — relatório revisto] (2017), disponível no sítio web do BPI em www.bis.org. Para mais informação sobre normas internacionais em matéria de resolução de infraestruturas do mercado financeiro, ver a orientação do Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board, FSB) constante do «Appendix II-Annex 1 — Resolution of Financial Market Infrastructures (FMIs) and FMI Participants» [apêndice II-anexo 1 — resolução das infraestruturas do mercado financeiro (FMI) e dos participantes das FMI] anexo ao documento Key Attributes of Effective Resolution Regimes for Financial Institutions (2014) [principais atributos dos regimes de resolução eficazes para instituições financeiras (2014)], disponível (em inglês) no sítio Web do FSB em www.fsb.org. O FSB emitiu uma orientação mais detalhada em «Guidance on Central Counterparty Resolution and Resolution Planning» [orientação sobre a resolução de contrapartes centrais e sobre o planeamento da resolução] em julho de 2017. Este documento também está disponível (em inglês) no sítio web do FSB.

(3)  Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa aos sistemas de garantia de depósitos (JO L 173 de 12.6.2014, p. 149).

(4)  Regulamento (UE) n.o 1095/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados), altera a Decisão n.o 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/77/CE da Comissão (JO L 331 de 15.12.2010, p. 84).

(5)  Regulamento (UE) n.o 648/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de julho de 2012, relativo aos derivados do mercado de balcão, às contrapartes centrais e aos repositórios de transações (JO L 201 de 27.7.2012, p. 1).

(6)  Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 1095/2010 que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados) e o Regulamento (UE) n.o 648/2012 no que respeita aos procedimentos e às autoridades envolvidos na autorização das CCP e aos requisitos para o reconhecimento das CCP de países terceiros, COM(2017) 331 final.

(7)  Ver Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO L 287 de 29.10.2013, p. 63).

(8)  Ver artigo 4.o, n.o 2, alínea h), do regulamento proposto.

(9)  Ver artigo 4.o, n.o 2, alínea c), do regulamento proposto.

(10)  Ver a resposta do BCE à consulta da Comissão sobre a revisão do Regulamento relativo à Infraestrutura do Mercado Europeu (EMIR), disponível em inglês no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

(11)  Ver artigo 1.o do regulamento proposto.

(12)  Ver artigo 2.o, ponto 17), do regulamento proposto.

(13)  Ver artigo 3.o, n.o 1, do regulamento proposto.

(14)  Ver os pontos 2.2 e 2.3 do Parecer CON/2017/2 do Banco Central Europeu, de 15 de fevereiro de 2017, sobre contas de pagamentos (disponível em língua inglesa e grega). Todos os pareceres do BCE são publicados no sítio web do BCE em www.ecb.europa.eu

(15)  Ver artigo 42.o, n.o 2, do regulamento proposto.

(16)  Ver o ponto 3.3 do Parecer CON/2012/99 do Banco Central Europeu, de 29 de novembro de 2012, sobre uma proposta de diretiva que estabelece um enquadramento para a recuperação e resolução de instituições de crédito e empresas de investimento (JO C 39 de 12.2.2013, p. 1).

(17)  Ver artigo 44.o do regulamento proposto.

(18)  Ver o ponto 3.4 do Parecer CON/2012/99.

(19)  Ver o artigo 27.o, n.os 3 e 4, do regulamento proposto.

(20)  Ver artigo 27.o, n.o 5, do regulamento proposto.

(21)  Ver artigo 13.o, n.o 3, do regulamento proposto.

(22)  Ver nota de rodapé 2.

(23)  Ver artigo 13.o, n.o 4, do regulamento proposto.

(24)  Ver artigo 10.o, n.o 4, do regulamento proposto.

(25)  Ver artigo 12.o, n.os 2 a 5, do regulamento proposto.

(26)  Tal implicaria que, se uma maioria de dois terços dos membros do colégio tivesse expressado uma opinião desfavorável em relação ao plano de recuperação, qualquer uma das autoridades implicadas poderia transferir o assunto para a ESMA para mediação.

(27)  Ver artigo 13.o, n.o 3, do regulamento proposto.

(28)  Ver artigo 13.o, n.o 3, alínea a), subalínea i), do regulamento proposto.

(29)  Ver artigo 13.o, n.o 4, do regulamento proposto.

(30)  Ver artigo 13.o, n.o 6, do regulamento proposto.

(31)  Ver ponto 7.5, alíneas i) e v), da «Guidance on Central Counterparty Resolution and Resolution Planning» do FSB.

(32)  Ibid., ponto 7.5, alínea xiii).

(33)  Ver artigo 13.o, n.o 8, do regulamento proposto.

(34)  Ver artigo 15.o do regulamento proposto.

(35)  Ver artigo 16.o, n.o 4, do regulamento proposto.

(36)  Ver artigo 17.o, n.o 7, alínea l), do regulamento proposto.

(37)  Ver Secção C do anexo do regulamento proposto sobre as questões que a autoridade de resolução deve ter em conta ao avaliar a resolubilidade de uma CCP.

(38)  Ver ponto 6 da «Guidance on Central Counterparty Resolution and Resolution Planning» do FSB.

(39)  O FSB vai prosseguir o seu trabalho sobre recursos financeiros para a resolução das CCP e, com base numa análise mais aprofundada e na experiência adquirida no planeamento da resolução, decidirá, até ao final de 2018, sobre a necessidade de uma nova orientação. Ver a introdução da «Guidance on Central Counterparty Resolution and Resolution Planning» do FSB.

(40)  Ver artigo 18.o do regulamento proposto.

(41)  Ver artigo 21.o, n.o 1, alínea d), do regulamento proposto.

(42)  Ver artigo 22.o, n.o 1, do regulamento proposto.

(43)  Ver artigo 27.o do regulamento proposto.

(44)  Entendendo-se este, de acordo com a definição constante no artigo 2.o, n.o 1, ponto 53), da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/CE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 173 de 12.6.2014, p. 190), como o «enquadramento estabelecido pelos artigos 107.o, 108.o e 109.o do TFUE e todos os atos da União, incluindo orientações, comunicações e avisos, elaborados ou adotados nos termos do artigo 108.o, n.o 4, ou do artigo 109.o do TFUE».

(45)  Ver ponto 6 do relatório do FSB referido na nota de rodapé 2.

(46)  Ver artigo 27.o, n.o 9, do regulamento proposto.


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